sábado, 21 de novembro de 2015

Declaração de constitucionalidade de lei "ainda" constitucional

Outro tema bastante interessante dentro do tema das ações de constitucionalidade/inconstitucionalidade, refere-se à posição do Supremo Tribunal Federal de declarar a constitucionalidade de leis, que ainda possuem um certo grau de compatibilização com o ordenamento jurídico.
Na verdade, o que o STF almeja é alertar o poder legislativo de que aquela norma está sofrendo um processo de inconstitucionalidade progressiva, e que no futuro tal lei deverá ser extirpada do ordenamento jurídico ou modificada.
Na Alemanha, a doutrina afirma que tal ato constitui um apelo ao legislador ou aos poderes públicos, para que tomem providência ou adotem postura para que tal norma não se torne inconstitucional.
Assim, da forma como é exposto, parece ser estranho visualizar uma situação deste tipo, mas pode-se citar alguns exemplos: prazo em dobro para a defensoria recorrer (afronta a isonomia e a paridade da armas). STF externaliza que é inconstitucional esta norma, mas como a defensoria pública ainda não está devidamente estruturada, o comando ainda continua constitucional, conforme decisão em HC 70514/RS[1].


Direito Constitucional e Processual Penal. Defensores Públicos: prazo em dobro para interposição de recursos (§ 5 do art. 1 da Lei n 1.060, de 05.02.1950, acrescentado pela Lei n 7.871, de 08.11.1989). Constitucionalidade. "Habeas Corpus". Nulidades. Intimação pessoal dos Defensores Públicos e prazo em dobro para interposição de recursos.
1. Não é de ser reconhecida a inconstitucionalidade do § 5 do art. 1 da Lei n1.060, de 05.02.1950, acrescentado pela Lei n 7.871, de 08.11.1989, no ponto em que confere prazo em dobro, para recurso, às Defensorias Públicas, ao menos até que sua organização, nos Estados, alcance o nível de organização do respectivo Ministério Público, que é a parte adversa, como órgão de acusação, no processo da ação penal pública.
2. Deve ser anulado, pelo Supremo Tribunal Federal, acórdão de Tribunal que não conhece de apelação interposta por Defensor Público, por considerá-la intempestiva, sem levar em conta o prazo em dobro para recurso, de que trata o § 5 do art. 1 da Lei n 1.060, de 05.02.1950, acrescentado pela Lei n 7.871, de 08.11.1989.
3. A anulação também se justifica, se, apesar do disposto no mesmo parágrafo, o julgamento do recurso se realiza, sem intimação pessoal do Defensor Público e resulta desfavorável ao réu, seja, quanto a sua própria apelação, seja quanto à interposta pelo Ministério Público.
4. A anulação deve beneficiar também o co-réu, defendido pelo mesmo Defensor Público, ainda que não tenha apelado, se o julgamento do recurso interposto pelo Ministério Público, realizado nas referidas circunstâncias, lhe é igualmente desfavorável. "Habeas Corpus" deferido para tais fins, devendo o novo julgamento se realizar com prévia intimação pessoal do Defensor Público, afastada a questão da tempestividade da apelação do réu, interposto dentro do prazo em dobro.

No mesmo sentido, a defesa dos hipossuficientes pelo Ministério Público - Rext n° 147.776 - no qual a defesa dos economicamente vulneráveis é de atribuição da defensoria pública. Todavia, em lugares onde ela ainda não existe, tal proteção ainda cabe ao Ministério Público[2].

Data de publicação: 19/06/1998
Ementa: Ministério Público: legitimação para promoção, no juízo cível, do ressarcimento do dano resultante de crime, pobre o titular do direito à reparação: C. Pr. Pen., art. 68, ainda constitucional ( cf . RE 135328): processo de inconstitucionalização das leis. 1. A alternativa radical da jurisdição constitucional ortodoxa entre a constitucionalidade plena e a declaração de inconstitucionalidade ou revogação por inconstitucionalidade da lei com fulminante eficácia ex tunc faz abstração da evidência de que a implementação de uma nova ordem constitucional não é um fato instantâneo, mas um processo, no qual a possibilidade de realização da norma da Constituição - ainda quando teoricamente não se cuide de preceito de eficácia limitada - subordina-se muitas vezes a alterações da realidade fáctica que a viabilizem. 2. No contexto da Constituição de 1988, a atribuição anteriormente dada ao Ministério Público pelo art. 68 C. Pr. Penal - constituindo modalidade de assistência judiciária - deve reputar-se transferida para a Defensoria Pública: essa, porém, para esse fim, só se pode considerar existente, onde e quando organizada, de direito e de fato, nos moldes do art. 134 da própria Constituição e da lei complementar por ela ordenada: até que - na União ou em cada Estado considerado -, se implemente essa condição de viabilização da cogitada transferência constitucional de atribuições, o art. 68 C. Pr. Pen. será considerado ainda vigente: é o caso do Estado de São Paulo, como decidiu o plenário no RE 135328. (grifos nossos)
Encontrado em: RE 147776 ED ANO-1999 UF-SP TURMA-01 N.PÁG-004 Min. SEPÚLVEDA PERTENCE DJ 28-05-1999 PP-00019 EMENT... DE PAULA RECURSO EXTRAORDINÁRIO RE 147776 SP (STF) Min. SEPÚLVEDA PERTENCE VOL-01952-04 PP-00656 Votação: Unânime. Resultado: Não conhecido. VEJA : RE-135328, ADI-558, RTJ...

       Logo, percebe-se, claramente, a posição do STF em não extirpar do ordenamento jurídico  qualquer tipo de lei, sob pena de agravamento do estado de inconstitucionalidade das mesmas.
Plausível tal atitude do Pretório Excelso, em oferecer uma interpretação conforme e progressiva às leis, até o estágio em que  não serão mais compatível com a Constituição.


Ana Luiza Albuquerque Kalil
Procuradora do Município de Barbacena
oab/mg - 128.444
Membro da associação
Especialista em Direito Constitucional


[1] - Direito Constitucional e Processual Penal. Defensores Públicos: prazo em dobro para interposição de recursos (§ 5 do art. 1 da Lei n 1.060, de 05.02.1950, acrescentado pela Lei n 7.871, de 08.11.1989). Constitucionalidade. "Habeas Corpus". Nulidades. Intimação pessoal dos Defensores Públicos e prazo em dobro para interposição de recursos. 1. Não é de ser reconhecida a inconstitucionalidade do § 5 do art. 1 da Lei n 1.060, de 05.02.1950, acrescentado pela Lei n 7.871, de 08.11.1989, no ponto em que confere prazo em dobro, para recurso, às Defensorias Públicas, ao menos até que sua organização, nos Estados, alcance o nível de organização do respectivo Ministério Público, que é a parte adversa, como órgão de acusação, no processo da ação penal pública. 2. Deve ser anulado, pelo Supremo Tribunal Federal, acórdão de Tribunal que não conhece de apelação interposta por Defensor Público, por considerá-la intempestiva, sem levar em conta o prazo em dobro para recurso, de que trata o § 5 do art. 1 da Lei n 1.060, de 05.02.1950, acrescentado pela Lei n 7.871, de 08.11.1989. 3. A anulação também se justifica, se, apesar do disposto no mesmo parágrafo, o julgamento do recurso se realiza, sem intimação pessoal do Defensor Público e resulta desfavorável ao réu, seja, quanto a sua própria apelação, seja quanto à interposta pelo Ministério Público. 4. A anulação deve beneficiar também o co-réu, defendido pelo mesmo Defensor Público, ainda que não tenha apelado, se o julgamento do recurso interposto pelo Ministério Público, realizado nas referidas circunstâncias, lhe é igualmente desfavorável. "Habeas Corpus" deferido para tais fins, devendo o novo julgamento se realizar com prévia intimação pessoal do Defensor Público, afastada a questão da tempestividade da apelação do réu, interposto dentro do prazo em dobro.

(STF - HC: 70514 RS , Relator: SYDNEY SANCHES, Data de Julgamento: 23/03/1994, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJ 27-06-1997 PP-30225 EMENT VOL-01875-03 PP-00450)
[2] Ministério Público: legitimação para promoção, no juízo cível, do ressarcimento do dano resultante de crime, pobre o titular do direito à reparação: C. Pr. Pen., art. 68, ainda constitucional (cf. RE 135328): processo de inconstitucionalização das leis. 1. A alternativa radical da jurisdição constitucional ortodoxa entre a constitucionalidade plena e a declaração de inconstitucionalidade ou revogação por inconstitucionalidade da lei com fulminante eficácia ex tunc faz abstração da evidência de que a implementação de uma nova ordem constitucional não é um fato instantâneo, mas um processo, no qual a possibilidade de realização da norma da Constituição - ainda quando teoricamente não se cuide de preceito de eficácia limitada - subordina-se muitas vezes a alterações da realidade fáctica que a viabilizem. 2. No contexto da Constituição de 1988, a atribuição anteriormente dada ao Ministério Público pelo art. 68 C. Pr. Penal - constituindo modalidade de assistência judiciária - deve reputar-se transferida para a Defensoria Pública: essa, porém, para esse fim, só se pode considerar existente, onde e quando organizada, de direito e de fato, nos moldes do art. 134 da própria Constituição e da lei complementar por ela ordenada: até que - na União ou em cada Estado considerado -, se implemente essa condição de viabilização da cogitada transferência constitucional de atribuições, o art. 68 C. Pr. Pen. será considerado ainda vigente: é o caso do Estado de São Paulo, como decidiu o plenário no RE 135328.

(STF - RE: 147776 SP , Relator: Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Data de Julgamento: 19/05/1998, Primeira Turma, Data de Publicação: DJ 19-06-1998 PP-00009 EMENT VOL-01915-01 PP-00136)