segunda-feira, 14 de março de 2016

Novo Código de Processo Civil: Como ficam os processos iniciados antes da vigência da nova lei?


                                    Com a vigência do Novo Código de Processo Civil – Lei 13.105/2015, a partir do dia 18 de março de 2016, importante questionamento surge quanto à aplicação das novas regras, em especial relativamente aos processos iniciados ainda sob a égide da lei antiga, mas ainda não concluídos.
                                   Como ficam tais ações? Serão concluídas com base na lei antiga? Serão totalmente convertidas para o novo formato? Os atos já praticados serão preservados? O que fazer com os prazos iniciados antes da nova lei e ainda não encerrados quando do início de sua vigência?  
                                  Diversos são os questionamentos. Contudo, a solução passa pelo próprio texto legal do Novo Código de Processo Civil, especificamente pelo artigo 14 que preceitua que “a norma processual não retroagirá e será aplicável de imediato aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada”, sendo necessário pequeno exercício interpretativo para alcance do sentido do dispositivo legal. 
                                 Partindo-se da premissa estabelecida pelo artigo mencionado, pode-se extrair quatro situações distintas: processos iniciados e encerrados antes da vigência do Novo Código de Processo Civil, processos iniciados após a vigência da nova lei, processos iniciados antes do novo diploma legal e ainda não concluídos e processos anteriores à nova lei, com atos pendentes. 
                                  Quanto ao primeiro caso, não subsiste qualquer dificuldade, na medida em que os processos iniciados e finalizados antes da vigência da Lei 13.105/2015, não serão por ela alcançados, vez que o comando legal é expresso ao determinar que a norma processual não retroagirá, ou seja, os processos concluídos se inserem no conceito de “situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada”, não sendo, pois, afetados e/ou alterados. 
                                   O segundo caso – processos iniciados após a vigência da nova lei processual – também não desafiam maiores considerações, na medida em que serão integralmente conduzidos sob o manto do novo diploma processual civil, não havendo que se perquirir acerca de eventual aplicação de dispositivos revogados.
                                   Quanto aos processos iniciados antes do novo diploma legal e ainda não concluídos – terceiro caso – tem-se a necessidade de trabalho interpretativo, identificando-se os diversos atos processuais praticados ao longo de toda a marcha processual, delimitando-se aqueles totalmente concluídos antes da nova lei e os iniciados após o dia 18 de março de 2016, incluindo tal data.
                                   Referida conduta é necessária porque o processo não se traduz em um único ato, mas sim em uma realidade complexa, decorrente da prática de diversos atos, seja pelas partes, pelo próprio juiz, pelos serventuários da justiça ou por terceiros (perito, intérprete, etc.), de maneira que em um mesmo processo podem conviver atos praticados com base tanto na lei revogada, quanto na lei nova.
                                    Assim, os atos iniciados e concluídos antes da lei nova não serão alcançados, afinal, a lei nova não retroagirá, respeitando-se os atos processuais e as situações jurídicas consolidadas com base na lei revogada. Ao contrário, a todos os atos posteriores ao início da vigência da lei processual nova serão aplicadas as novas normas processuais, sem qualquer alteração dos atos anteriormente praticados.
                                   Por fim, calha analisar a quarta hipótese: processos iniciados antes da lei nova, ainda não concluídos e com atos pendentes. São considerados atos pendentes aqueles cujo prazo para sua prática já se iniciou, mas cujo termo final ainda não fora alcançado. Em outras palavras, a prática do ato se iniciou antes da lei nova, mas sua conclusão somente se dará após a vigência do Novo Código de Processo Civil.
                                   Imagine-se, por exemplo, que o início do prazo para apresentação de contestação (defesa do réu) – como regra geral, prazo de 15 (quinze) dias – tenha se iniciado em 09 de março de 2016, incluindo esta data. É certo que o prazo somente encontrará seu termo final no dia 23 de março de 2016, data em que já estará vigente a Lei 13.105/2015.
                                   Neste caso, qual a regra a ser aplicada? A regra do Código de 1973 ou a do Novo Código? Ou ambas conjuntamente?
Tal distinção é importante, na medida em que os prazos, na sistemática da lei revogada, são contados de forma corrida, ou seja, incluem sábados, domingos e feriados, desde que o prazo não se inicie ou não termine em dia não útil, enquanto na nova lei processual a contagem se faz em dias úteis, excluindo-se de seu cômputo, portanto, os dias não úteis.
Pois bem, nesta hipótese, não será aplicada a norma processual nova, mas sim a norma vigente à época em o ato tem seu termo inicial, afinal, neste momento é que surge para a parte o direito (e ao mesmo tempo a necessidade) de se praticar o ato processual, ainda que o prazo para seu cumprimento se estenda além da vigência da lei que o regulamentava.
Isto posto, tem-se que os atos cujo prazo para realização se iniciou anteriormente à vigência da lei nova, continuarão observando a lei revogada até a concretização do ato, ou até a fluência do prazo previstopara a sua prática, projetando-separa o futuro, portanto, os efeitos da lei revogada, exclusivamente quanto à prática destes atos.
No exemplo proposto, a contestação será apresentada observando o prazo em dias corridos – regra do revogado diploma processual de 1973 – mesmo já se encontrando vigente a nova lei que define prazo em dias úteis e ainda que este novo tratamento seja mais benéfico as partes.
Conclui-se, portanto, a partir da análise das quatro possíveis hipóteses e do artigo 14 do Novo Código, que a lei processual nova ao entrar em vigor se aplica de imediato a todos os processos pendentes, regulando as situações jurídicas cujo termo inicial seja posterior a sua vigência, mas nunca retroagindo efeitos para alcançar os processos e atos concluídos sob a vigência da lei anterior. Quanto aos atos pendentes – iniciados antes da nova lei, mas ainda não concluídos – tem-se a aplicação da lei antiga até sua conclusão, mesmo já estando vigente o Novo Código.
 
 
 Júlio César da Costa – OAB/MG 103.272
  Advogado de carreira do Município de Barbacena
  Professor Direito Processual Civil –CESA – Centro de Estudos Superiores Aprendiz
  Membro ABCJ – Academia Barbacenense de Ciências Jurídicas – Ocupante da Cadeira nº 25
  Vice-presidente APMB – Associação Procuradores do Município de Barbacena

domingo, 6 de março de 2016

OS JUIZADOS ESPECIAIS E O DILEMA DA COMPETENCIA PARA JULGAMENTO DE AÇÕES ENVOLVENDO O PODER PÚBLICO


Visando conferir maior celeridade aos processos em que uma das partes é a Fazenda Pública, foi publica em 2009 a Lei 12.153, que dispõe sobre os Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios.

Tal dispositivo legal permitiu que os processos em que o Poder Público fosse parte pudessem ser julgados pelos Juizados Especiais da Fazenda Pública, inovação importante, visto que antes da mencionada Lei tais ações eram julgadas somente pela Justiça Comum.

Ocorre que o Poder Judiciário não estava devidamente equipado para a aplicação da dita Lei, visto que na maioria das Comarcas do país não existiam os ditos Juizados Especiais da Fazenda Pública.

Diante desta ausência, os Juizados Especiais comuns começaram então a ser competentes para o julgamento de algumas ações em que o Poder Público era parte. Em Minas Gerais ficou a cargo de uma Resolução do TJMG (Resolução n 700 de 2012) indicar quais ações seriam de competência do Juizado e quais continuariam na Justiça Comum.

Ocorre que tal resolução possuía um prazo de validade, em seu art. 8° dizia que a limitação que ela trazia se encerraria em 23/06/15. Assim, a partir desta data todas as ações contra entes públicos, cujo valor não excedesse a 60 (sessenta) salários-mínimos seriam processados nos Juizados Especiais.

A partir deste momento surgiram os problemas na Comarca de Barbacena.

No dia seguinte ao fim da limitação, os Juízes das Varas Cíveis começaram a se dar por incompetentes para qualquer ação em que o Poder Público fosse parte (desde que o valor da causa não ultrapassasse os 60 (sessenta) salários mínimos) remetendo os processos para o Juizado Especial Comum.

Neste ponto é necessário esclarecer que conforme firmado na lei (art. 4º do art.2º da Lei 12.153/2009) e depois pacificado pela jurisprudência, nos Juizados Especiais da Fazenda Pública, a competência é absoluta, portanto, não se prorroga, independe de exceção para ser conhecida, pode ser declarada de ofício pelo juiz. Portanto, os Juízes das Varas Comuns não precisavam esperar que qualquer das partes alegasse a dita incompetência.

No início não houve nenhum problema em Barbacena, os Juízes do Juizado Especial começaram a aceitar as ações que chegavam as suas mãos, remetidas pela Justiça Comum, além daquelas que já estavam sendo distribuídas no próprio Juizado.

Ocorre que no fim do ano de 2015 uma das Varas do Juizado Especial de Barbacena começou a se dar por incompetente para julgar todas as ações que tinha como parte o Poder Público, por entender que, como em Barbacena não fora instalado o Juizado da Fazenda Pública, a competência seria da Justiça Comum.

Instaurou-se em nossa Comarca um abismo. Onde propor as ações contra o Poder Público?

Vários incidentes de conflito de competência já foram instaurados, sendo certo que o TJMG já indicou o Juízo do Juizado Especial como o competente para medidas urgentes.

Outros vários Recursos Inominados também já foram apresentados, mas ainda não se tem notícia, até o presente momento[1], de nenhuma decisão que tenha sido tomada pela Turma Recursal desta comarca.

Deve-se deixar claro que apenas uma das Varas do Juizado está se dando por incompetente, a outra continua recebendo as ações envolvendo o Poder Público, e dando o devido prosseguimento.

Mas como não se pode escolher em qual Juízo sua ação será processada, os advogados e partes atualmente se encontram em um grande dilema: tentam a sorte e distribuem suas ações no Juizado na esperança de que caia na Vara que está dando prosseguimento às ações, ou esperam o TJMG ou a Turma Recursal decidirem os conflitos que foram postos em suas mãos?

Enquanto este conflito não se resolve, os jurisdicionados ficam sem ter o devido acesso á Justiça preservado pelo art. 5, inciso XXXV da Constituição Federal. Só nos restando aguardar a solução que nos será dada. Só esperamos que não demore, para que a Justiça envolvendo o Poder Público possa voltar a andar em Barbacena.

 

 

Antônio Valente Ferreira Neto

Procurador Efetivo do Município de Barbacena

OAB/MG 125.369



[1] - Artigo Publicado em 06/03/2016, data em que os recursos inominados acerca do tema ainda não haviam sido julgados.