domingo, 22 de maio de 2016

Associação dos Procuradores do Município consegue liminar impedindo corte de ponto durante o período de greve.

Juiz entende que greve decorrente de cobrança de salários em atraso não pode acarretar corte de ponto relativo aos dias paralisados.





                                   No dia 29 de abril do corrente ano, o sindicato dos Servidores Públicos do Município de Barbacena deflagrou greve geral em decorrência de reiterados atrasos de pagamentos pela municipalidade – em especial referentes a novembro e décimo terceiro salário de 2012, um terço do décimo terceiro de 2014 e décimo terceiro de 2015 – bem como em decorrência do descumprimento da lei municipal 4.747/2016, que concede reajuste salarial aos servidores, e vem sendo descumprida pelo Executivo Municipal, contando com adesão de cerca de 80% (oitenta por cento) dos servidores.
                                    Conforme se noticiou, a APMB – Associação dos Procuradores Municipais de Barbacena – aderiu ao movimento paredista, entendendo que todos os requisitos para configuração da legalidade da greve foram observados e, principalmente, por reconhecer que as circunstancias exigem medidas extremas.
                                    No âmbito interno administrativo fora noticiado o corte do ponto de todos os servidores que aderiram à paralização, tendo sido adotadas medidas para apuração dos servidores envolvidos e identificação do período paralisado.
                                    Visando evitar o corte do ponto dos Advogados de Carreira do município, a APMB, representada pelo competente advogado Dr. Philipe Forte Lima, OAB/MG 107.283, ingressou com ação cominatória de obrigação de fazer cumulada com pedido de liminar, para que o Município se abstenha de proceder ao desconto em folha de pagamento dos advogados que aderiram à greve.
                                    Segundo Dr. Philipe, “sendo a greve proposta em decorrência de salários atrasados, não é possível efetuar o corte do ponto dos dias paralisados, por não ser razoável admitir que os servidores buscando o recebimento de pagamentos em atraso, renunciem ao próprio pagamento durante a paralização”.
                                    Referida ação fora distribuída para a Primeira Vara Cível de Barbacena, via PJE – Processo Judicial Eletrônico – sob o nº 5001798-41.2016.8.13.0056, tendo sido deferida a liminar pretendida, impedindo-se que o Município de Barbacena efetue o corte de ponto dos Advogados de Carreira sob pena de aplicação de multa de R$ 100,00 (cem reais) ao dia, para cada corte realizado, relativamente a cada servidor.
                                    Destaque-se que o Magistrado prolator da decisão reconheceu a legalidade da greve, haja vista a prévia comunicação ao Prefeito Municipal com antecedência mínima de 72 (setenta e duas) horas, bem como a manutenção dos percentuais mínimos necessários ao serviço, além de acolher o argumento da APMB quanto a impossibilidade de corte de ponto quando o movimento paredista decorre de cobrança de salários atrasados.
                                    Segue abaixo transcrição da decisão:
 
 
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
COMARCA DE BARBACENA
1ª Vara Cível da Comarca de Barbacena
Rua Belizário Pena, 456, Centro, BARBACENA - MG - CEP: 36200-012
PROCESSO Nº 5001798-41.2016.8.13.0056
CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM (7)
ASSUNTO: [Direito de Greve]
AUTOR: APMB ASSOCIACAO DOS PROCURADORES MUNICIPAIS DE BARBACENA
RÉU: MUNICIPIO DE BARBACENA
 
Vistos, etc.
 
1. Defiro o pedido de gratuidade de justiça formulado pela parte Autora.
 
2. Trata-se de procedimento comum, com pedido de tutela de urgência, ajuizada por ASSOCIAÇÃO DOS PROCURADORES DO MUNICÍPIO DE BARBACENA, qualificada nos autos, em desfavor do MUNICÍPIO DE BARBACENA, também qualificado, nos termos da petição inicial, que veio instruída por documentos, alegando, em resumo que:
 
Os servidores públicos municipais estão com diversos vencimentos em atraso, tais como, salário do mês de novembro de 2012; 13º salário de 2012, 1/3 (um terço) do 13º salário de 2014 e o 13º salário de 2015. Além disso, os vencimentos dos servidores estão defasados há vários anos, sem aumento ou nenhum reajuste.
Alegam que foi aprovada lei municipal sancionada pelo Prefeito que reajustou os vencimentos dos servidores em 11,67%, retroativos a 1º de janeiro de 2016, e que tal lei possibilitou que o reajuste fosse parcelado em três vezes, iniciando-se o pagamento referente ao mês de março de 2016 e recebido no mês de abril de 2016. Determinou, ainda, a lei o parcelamento em três vezes do 13º salário de 2015, com pagamento da primeira parcela em junho.
Aduz que o executivo municipal descumpriu a lei e não aplicou a primeira parcela do reajuste, alegando inexistência de suporte financeiro.
Assevera que a categoria dos servidores, através de Assembleia Geral, deliberou pela greve, sendo esta precedida pela necessária comunicação ao Chefe do Executivo.
Alega que está sendo respeitado o percentual mínimo do serviço, em atendimento ao princípio da continuidade do serviço público, já que os servidores comissionários e contratados não aderiram à greve.
Requer o deferimento da tutela de urgência requerida, e, ao final, seja julgado procedente o pedido posto em Juízo.
 
Vieram-me os autos conclusos.
Tudo visto e examinado.
 
Expõe o art. 300 do Código de Processo Civil que a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Sobre o tema, destaco que o Supremo Tribunal Federal, nos Mandados de Injunção nº670/ES, 708/DF e 712/PA, reconheceu a eficácia imediata do direito constitucional de greve aos servidores públicos (art. 37, inciso VIII, da Constituição), devendo, tal direito ser exercido conforme a Lei Federal n.º 7.783, até a sanção de lei que regulamente a matéria.
No que tange aos descontos aos dias de falta em razão do movimento grevista, foi reconhecida repercussão geral do tema pelo STF, através do recurso representativo de controvérsia nº AI 853275 RG-RJ (reautuado, em 05.06.2012 para o RE nº 693.456):
 
DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDORES PÚBLICOS E DIREITO DE GREVE. ANÁLISE DA LEGALIDADE DO ATO QUE DETERMINOU O DESCONTO DOS DIAS PARADOS, EM RAZÃO DA ADESÃO A MOVIMENTO GREVISTA. DISCUSSÃO ACERCA DO ALCANCE DA NORMA DO ARTIGO 37, INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MATÉRIA PASSÍVEL DE REPETIÇÃO EM INÚMEROS PROCESSOS, A REPERCUTIR NA ESFERA DE INTERESSE DE MILHARES DE PESSOAS. PRESENÇA DE REPERCUSSÃO GERAL.” (grifei) 
 
Embora não tenha havido a conclusão do mérito do mencionado recurso, o Plenário do STF iniciou o julgamento sobre a matéria, em que o Ministro relator fixou as seguintes premissas: “a) a deflagração de greve por servidor público civil corresponde à suspensão do trabalho e, ainda que a greve não seja abusiva, como regra geral, a remuneração dos dias de paralisação não deve ser paga; e b) o desconto somente não se realizará se a greve tiver sido provocada por atraso no pagamento aosservidores públicos civis ou se houver outras circunstâncias excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão da relação funcional ou de trabalho, como aquelas em que o ente da Administração ou o empregador tenha contribuído, mediante conduta recriminável, para que a greve ocorra ou em que haja negociação sobre a compensação dos dias parados ou mesmo o parcelamento dos descontos” (grifei) (publicação no Informativo de Jurisprudência nº 797, de 4 de setembro de 2015).
 
Tal entendimento seguiu a jurisprudência da Corte nos julgamentos dos MI 670/ES; MI 708/DF e MI 712/PA.
Sendo assim, tendo em vista que um dos motivos da paralisação dos servidores municipais, defendidos pela associação autora, é o inadimplemento/atraso no pagamento de verbas salariais, entendo que o caso se enquadra na hipótese de exceção criada pelo entendimento jurisprudencial do STF, que prevê a impossibilidade de corte dos dias não trabalhados nesse caso.
Pela análise preliminar dos autos, verifico que houve a prévia comunicação do Chefe do Executivo, e pela manifestação da parte, mantido o percentual necessário para preservar a continuidade do servidor público.
O perigo de demora encontra-se consubstanciado na natureza alimentar da verba e na iminência do corte do pagamento dos dias não trabalhos.
Importante frisar, ainda, ser possível negociação administrativa para compensação dos dias não trabalhos, o que afasta a necessidade de qualquer tipo de corte.
Sendo assim, defiro a tutela de urgência antecipatória para determinar que o Município de Barbacena se abstenha de proceder descontos em folha de pagamento dos advogados efetivos pelos dias não trabalhos em função da greve, sob pena de multa de R$100,00 (cem reais) por desconto realizado, limitado a R$ 20.000,00(vinte mil reais), sem prejuízo de majoração posterior, caso necessário.
 
3.Considerando o disposto no art. 334, §4º, I, CPC, havendo manifestação expressa da parte autora, designo a audiência de tentativa de conciliação para o dia 21/09/2016, às 14:00 horas.
 
4.Intime(m)-se a(s) parte(s) Autora(s)a comparecer (art. 334, § 3º e § 9º, CPC), sob pena de multa de 2% do valor da causa (art. 334, § 8º, CPC).
 
5.Com antecedência mínima de 20 dias, CITE(M)-SE a(s) parte(s) Requerida(s) e INTIME(M)-SE de tutela de urgência deferida, bem como a comparecer(em) à audiência (art. 334, § 9º, CPC), sob pena de multa de 2% do valor da causa (art. 334, § 8º, CPC).
 
6.Advirta(m)-se de que o prazo de 30dias para contestação fluirá independentemente de intimação ou manifestação judicial superveniente a partir da data da realização da audiência (art. 335, caput e inciso I, CPC), se não houver acordo, bem como dos efeitos da não contestação(art. 344, CPC).
Advertindo-o, ainda, que em caso de recurso, nos termos do artigo 6º, 378 e 1.018 do NCPC, o réu deverá comunicar este juízo de sua interposição, para evitar a estabilidade determinada no artigo 304, “caput”, do NCPC.
 
7. Caso sobrevenha manifestação de desinteresse de ambas as partes, na forma e prazo do art. 334, § 4º, I e §§ 5º e 6º, cancele-se incontinenti a audiência designada, cientifiquem-se as partes, na pessoa dos advogados, para a exclusiva finalidade de se evitar comparecimento desnecessário, e aguarde-se o término do prazo para contestação, observando-se o disposto no art. 335, I, II e § 1º, CPC.
 
8. Findo o prazo do art. 335, CPC, intime(m)-se a(s) parte(s) autora(s)para se manifestar em 15 dias, para os fins isolada ou cumulativamente previstos nos arts. 338, 348, 350 e 351, CPC.
 
Intime-se. Cumpra-se. 
Lélio Erlon Alves Tolentino
Juiz de Direito
BARBACENA, 13 de maio de 2016.

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